sexta-feira, 13 de agosto de 2010

Last mango in Acapulco

 






Acapulco, Julho de 2010

Ainda não totalmente refeito dos efeitos do jet lag, desperto bem cedo para a minha primeira manhã em Acapulco.

À saída do quarto para um corredor do hotel sinto de imediato uma onda de choque contra mim. Uma massa de ar quente e húmido parecia envolver o meu corpo. Adivinhava-se uma corrida feita com muito suor.

Ainda assim o céu está nublado o que acaba por amenizar uma temperatura que ronda os 30 graus e uma humidade de 80%.

Início o treino junto ao Hotel El Cano na avenida marginal La Costera (Avenida Costera Miguel Aleman). Os primeiros quilómetros são percorridos num passeio partilhado com alguns transeuntes madrugadores. Do lado da estrada já se registam os inevitáveis engarrafamentos nesta avenida. Do outro lado uma fiada de edifícios densos e imponentes esmagam qualquer ambição de podemos vislumbrar a Baía de Acapulco.

Ouve-se um coro de buzinas dos motociclos mais pequenos aos camiões mais pesados. Sobrepõem-se ainda os ruídos dos motores de dezenas de táxis Volkswagen carocha, muito populares nesta região do México (Estado de Guerrero) pelas suas características únicas (força e fiabilidade segundo os taxistas locais).

A atmosfera adensa-se pelos gases expelidos por muitas viaturas de alta cilindrada que certamente não tiveram qualquer preocupação ecológica na sua construção.

Dezenas de vendedores ambulantes deambulam pelas ruas tentando vender todo o tipo de peças.

Todo este caos de imagens, ruídos e cheiros, bem como uma temperatura que parecia não parar de aumentar e uma humidade nos píncaros tornavam penosos os primeiros quilómetros de treino. Precisava de um momento de regeneração que viria com o Parque Papagayo. Ali como que me isolei momentaneamente da desordem urbanística de Acapulco.

As árvores do parque insonorizavam os ruídos da La Costera e projectavam uma sombra refrescante por todos os caminhos que percorria. Pelo meu percurso só conseguia ouvir risos de crianças curiosas em visitas de estudo e papagaios nervosos enjaulados.

Mas o perímetro do parque é curto e não é representativo das paisagens e gentes de Acapulco. Pelo que dou uma só volta para me recompor e regresso aos caos da urbe.

Contudo, e para minha surpresa, logo após o Parque Papagayo a La Costera como que se libertou do trânsito acumulado e dos prédios que escondem a Baía. Ganho novo ânimo para prolongar o treino. Nos passeios que entretanto ficaram mais largos vendem-se agora granizados multi-sabores de aspecto duvidoso e marisco.

A atmosfera pesada pelos gases dos escapes é agora dominada pelo cheiro a mar e a peixe que chega à praia em barcos de pesca artesanal rebocados manualmente por pescadores.

Alcanço o Forte de San Diego elevado sobre a avenida marginal. Depois de uma volta ao jardim procuro a saída mais próxima e o cenário volta a mudar.

Subitamente estou numa rua de casas baixas e degradadas. Múltiplos cabos de electricidade e telefone cruzam-se a alguns metros de altura. À porta de uma das casas está um senhor sentado a fumar. A única pessoa naquele pedaço de rua. Cumprimento-o e ele fica indiferente. Não responde. Mais adiante vejo uma mulher alta a varrer a entrada de um bar. Ao passar mais perto vejo que é um travesti. Apercebo-me então que estou numa zona “free of Gringos”. Ao acabar de descer a rua tenho duas opções. Voltar à La Costera ou ir um pouco mais adiante neste bairro onde não há qualquer sinal de turistas.

Nesse momento lembro-me do que aprendi com o meu sábio grupo de corrida da marginal de Luanda: se estás numa zona que não te inspira confiança corre rápido e com um ar decidido. Ninguém se mete contigo. Se fores devagar e com um ar cansado, as probabilidades de se meterem contigo aumentam.

E assim foi. Entrei por aquela rua com uma passada vigorosa e sem perder a oportunidade de absorver cada detalhe daquele quadro. Paredes pintadas de várias cores com reclames publicitários. Lojas nos pisos térreos sem janelas e paredes e que dão acesso directo para a rua. Frutarias que perfumam momentaneamente alguns dos metros que percorro. Barbeiros sempre ocupados, churrasqueiras que trabalham a todo o gás como se já fosse hora de almoço.

Alcanço um cruzamento que marca o meu ponto de retorno. Sinto-me em “casa” depois de ver um par de camisolas da Selecção de Portugal e aproveito para tirar algumas fotos do telemóvel.

Regresso a um bom ritmo em direcção ao hotel. Mas suspiro por um mergulho refrescante nas águas do Pacífico.

No final, para além do mergulho, ainda pude saborear uma manga fantástica que comprei a um vendedor ambulante. E lembrei-me de uma música country do Jimmy Buffett, que me foi apresentada através de um livro do Robert James Waller “Música na Fronteira”:

“He said I ate the last mango in Paris
Took the last plane out of Saigon
Took the first fast boat to China
And Jimmy there's still so much to be done”

Sem dúvida que há ainda muito caminho por percorrer por esse mundo fora...
 
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