![]() |
Estádio dos Coqueiros de dia |
O genial (?) Edíficio CIF
Luanda, Março de 2011
A noite caiu abruptamente sobre a cidade de Luanda. Saio do escritório desconfortável e irritado.
O João está animado. E acompanha com pancadas no volante o ritmo de um “pagode” que faz estremecer as colunas do frágil Hyundai Getz.
Estava cansado e irritado. Sem paciência. Amanhã teria que ser capaz de ouvir as músicas do João com outro espírito.
Decidi treinar então. O primeiro treino desde regresso a Luanda.
Antes de sair de casa lanço um olhar de soslaio sobre o debate parlamentar em Portugal sobre a causa das coisas.
Chego à rua e começo de imediato o treino. Não se pode dizer que tenha começado a frio, pois apesar de ser noite estão certamente 30º e uma humidade que torna o ar pesado e irrespirável.
O ponto de partida é o Bairro Azul que me faz lembrar um bairro de vivendas ali para os lados de Benfica em Lisboa. Casa sim, casa não, um segurança à porta sentado em banco de plástico branco encardido. Cumprimento alguns e todos, sem excepção, respondem com um “Ok! Obrigado!” ou “Obrigado Sinhor!”. Muitos têm uma telefonia sintonizada num jogo de futebol ou basquete. Outros, mais sofisticados, têm uma televisão apoiada em frágeis bancos de madeira.
Subo uma rua escura.
Alcanço a Cidade Alta, onde estão sedeadas as mais altas instâncias militares angolanas e o palácio presidencial para depois descer em direcção à marginal completamente vedada a transeuntes. Um longo período de obras devolverá a glória e beleza do lugar mais nobre de Luanda.
Estou a fazer uma missão de reconhecimento a Luanda e sinto-me meio perdido. Sem saber para onde ir. Acabo por optar pelo Estádio dos Coqueiros. Ao lado, um restaurante muito frequentado por portugueses. Na falta de um jogo de futebol, a TV sintonizava o deprimente espectáculo político. Já é tarde e à porta dois seguranças pedem-me (com razão) por um papel para poder entrar. Peço para facilitar e pago o valor normal de entrada (150 Kwanzas). Acabo por deixar um pouco mais para estimular o crescimento de uma rede de amigos com quem me vou cruzar nos próximos tempos. Os guardas radiantes com a oferta disseram-me para mencionar sempre os seus nomes deles quando ali regressar.
- “Armindo e Cabral! Mas sem dinheiro! Porque dinheiro estraga a amizade!” – refere um dos guardas com um sorriso rasgado.
Após uma dezena de voltas pela pista escura do estádio, despeço-me dos guardas e regresso a casa pelo mesmo caminho. Uma subida íngreme leva-me da baixa até à cidade alta.
Pelo caminho passo por alguns prédios em construção e outros novos que revolucionaram as linhas urbanas de Luanda. Alguns chamam-lhe sinais da modernidade. Outros uma disputa sobre quem tem o mais alto e luxuoso edifício de Luanda ou pura falta de bom gosto.
Dentro desta última categoria de opiniões, há um edifício que se destaca dos demais.
Construído em tempo record por chineses, este edifício de 29 andares destaca-se de noite pelas luzes “led” que cobrem toda a sua fachada projectando desenhos coloridos das mais diversas formas.
Continuo a subir e por entre estas nuvens de poeira, passo pela Assembleia Nacional de Angola. Luzes apagadas. Silêncio e dois guardas em modo “screensaver”. Tudo calmo e tranquilo.
Já em casa e depois do banho, ouvimos incrédulos às palavras de dor e consternação do José em versão pós-demissão. Vítima da conjuntura financeira internacional, dos especuladores, da oposição. Jamais dos seus próprios actos. O desconforto e a irritação regressaram de novo.